No dia 29 de maio deste ano, ao subir na tribuna do Senado para fazer um pronunciamento, o senador paraense, Jader Barbalho (MDB), fez uma premonição: “A Floresta Amazônica está correndo o sério risco de ter uma elevação considerável no desmatamento nos próximos meses”. Mais de 100 dias depois do alerta, o cenário de queimadas e destruição do ecossistema amazônico chamou a atenção do mundo. A imprensa mundial retratou como o pior período de queimadas da história.
No dia em que foi à tribuna, o parlamentar paraense denunciava a intenção do ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, de utilizar os recursos do Fundo Amazônia – que somam cerca de US$ 700 mil – para pagar indenizações a donos de propriedades privadas que vivem em áreas de unidades de conservação, eliminando passivos de indenizações acumulados que não foram pagos desde a criação dessas unidades.
Na prática, o que o ministro do Meio Ambiente pretendia fazer era usar o dinheiro doado pelos países europeus, no caso a Noruega e a Alemanha, para financiar a compra de terrenos e propriedades localizadas em áreas protegidas, o que, de acordo com o senador, desvirtua o que foi acordado em 2008 entre o Brasil e os países doadores.
Após esse episódio, a ação pretendida pelo ministro foi interrompida. As relações entre o Brasil e os países doadores foram rompidas e o volume de recursos que está depositado no BNDES parou de ser utilizado. Os países doadores também pararam de doar. O Fundo Amazônia iniciou um processo de rápida desativação em pouco mais de 100 dias.
Durante a semana passada o tema “Fundo Amazônia” voltou à mídia. Desta vez, os governadores da Amazônia Legal passaram a discutir diretamente com os embaixadores no Brasil dos países doadores a possibilidade de criação de um novo fundo que possa ser gerido pelo Consórcio Interestadual de Desenvolvimento Sustentável da Amazônia Legal, constituído por Amapá, Acre, Maranhão, Amazonas, Mato Grosso, Roraima, Pará, Rondônia e Tocantins.
Para o senador Jader Barbalho, o Brasil não pode abdicar de recursos internacionais quando o tema for a proteção da Amazônia. “É preciso deixar claro que não se trata aqui de um ‘favor’ entre nações. O recurso doado por esses países faz parte de acordo firmado pelo governo brasileiro durante a 12ª Conferência (COP-12) da Convenção das Nações Unidas sobre Diversidade Biológica, quando foi instituída a contribuição voluntária de países em desenvolvimento para a redução de emissões de gases de efeito estufa, resultantes do desmatamento e da degradação das florestas. Ou seja, é um compromisso vinculado à redução da emissão de gases”, explicou.
INFORMAÇÕES SOBRE O FUNDO
Em 2017, quando não se ouvia falar do Fundo Amazônia, o senador paraense já focava sua preocupação com a possibilidade de interrupção dos projetos financiados pelo Fundo. Naquele ano, a política ambiental brasileira e suas ações para conter o desmatamento estavam sendo duramente criticadas por organismos internacionais, incluindo o governo norueguês, principal financiador do Fundo Amazônia, que ameaçava cortar os repasses pela metade.
“Solicitei informações ao Ministério de Meio Ambiente sobre todo o procedimento do Fundo Amazônia. Minha intenção na época foi conhecer os programas e projetos financiados e se o recurso estava de fato acessível à população da Amazônia”, lembra o senador Jader.
“No Pará, por exemplo, temos um imenso vazio demográfico, com grandes áreas de florestas, onde precisamos conciliar o desenvolvimento com o meio ambiente. Para isso é imprescindível o apoio de fundos de desenvolvimento, como o da Amazônia. Fica claro que não podemos abrir mão desse apoio financeiro”, ressalta o senador.
De acordo com resposta encaminhada ao gabinete do senador Jader Barbalho, o BNDES informou que o Fundo Amazônia contava naquele ano com R$ 1 bilhão e 726 milhões de reais em caixa. Outros 898 milhões estavam sendo aplicados em 98 projetos.
Esse volume de recursos era resultante de três doadores: governo da Noruega (R$ 2.914.355.262,70), República Federativa da Alemanha (R$ 192.690.396,00) e Petrobrás (R$ 16.045.600,53). Ou seja, mantem em caixa quase 1 bilhão para investimentos.
No Pará estavam sendo apoiados nove projetos individuais – com a participação de instituições, municípios ou outros setores – no valor total de R$ 196 milhões. Do total de projetos, sete já estavam contratados e dois foram aprovados e estavam em estágio de contratação.
Outros 14 projetos estavam em andamento em parceria com outros estados como Maranhão, Amazonas, Amapá, Roraima, Rondônia, Tocantins, Mato Grosso, Acre, entre outros, chamados de projetos regionais para a Amazônia Legal ou para o bioma Amazônia.
“Me surpreendeu na época, saber que pouco mais de 52% do valor doado ao fundo estava sendo utilizado em projetos na Amazônia. Acredito que a proposta de gestão que está a ser construída, com a participação direta dos Estados, vai beneficiar de forma mais objetiva os projetos na região amazônica”, defendeu o senador Jader.
O Fundo foi criado em 2008 com a finalidade de captar doações para investimentos não reembolsáveis em ações de prevenção, monitoramento e combate ao desmatamento e de promoção da conservação e do uso sustentável das florestas no Bioma Amazônia.
A gestão do Fundo cabe ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Atualmente são financiados 98 projetos em áreas com grande risco de desmatamento, na regularização fundiária e gestão territorial e ambiental de terras indígenas.
POR QUE A NORUEGA PARTICIPA
A Noruega é o 15º maior produtor de petróleo do mundo, à frente de Qatar e Reino Unido. O país é, indiretamente, um dos grandes responsáveis pelo aquecimento global devido à queima dos combustíveis fósseis que produz. O processo libera gases do efeito estufa. O país busca se engajar no combate à emissão desses gases e se tornou um doador para sistemas de proteção de florestas em países como Indonésia, Libéria e Peru.
Em 2009, o governo brasileiro fechou um acordo com a Noruega para que ela investisse no Fundo Amazônia, o que fez com que o país se tornasse o maior doador.